sexta-feira, 24 de maio de 2019

Atitude Marcial

(Palestra de Mestre Senior Julio Camacho, UFRJ)

Em 2017 tive a portunidade de assistir a uma palestra ministrada por Si Fu, Mestre Senior Júlio Camacho na UFRJ. Foi inspirador observar Si Fu usando suas habilidades em um ambiente diferente dos que estava acostumado a presenciar.


(Patriarca Moy Yat e Mestre Senior Julio Camacho, EUA)

 Certa vez Si Fu me contou que patriarca Moy Yat costumava praticar 24h por dia, vendo minha cara de espanto ele explicou:
"Sitaai gung era Si Fu em todos os momentos do dia, não somente quando usava sua roupa de prática ou quando estava em sua sala de treino, para ele ser Si Fu era em todas as situações ter uma atitude marcial." Entendi o que Si Fu quis dizer, mas ainda faltava algo.


(UFRj, 2017)

Ao fim da dita palestra, Si Fu pediu que todos os alunos fizessem comentários do que haviam aprendido; uma das alunas visivelmente tímida fez seu comentário muito baixinho, Si Fu levantou e se dirigiu até a moça para o fim de ouvir melhor o que ela tinha a dizer. Entendi que se ele pedisse que ela repetisse ela poderia se constranger e não falar mais nada, ou, caso repetisse, poderia ser mais uma vez em tom de voz baixo; quando Si Fu se aproxima ele tem mais que uma atitude de cuidado já que desta vez a moça pode falar em seu tom de voz sem dificuldades, seu gesto garantiu que seu objetivo seja cumprido. A partir desta experiência pude entender que tomar atitudes que facilitem ou garantam o cumprimento de meus objetivos é uma atitude marcial. Acho que a partir daí a história que Si Fu me contou fez mais sentido.

sábado, 18 de maio de 2019

Uma lente Kung Fu

(Cerimônia de acesso ao domínio Baat Jaam Do, 2017)

O Ving Tsun, por diversas vezes, é difícil de ser apreendido, cada técnica de combate ainda que simbólico, nos propõe uma experiência marcial real.

(Estudo de Siu Nin Tau, 2008)

Todas as pessoas que nos procuram já possuem experiências significativas de vida, e suas próprias ideias do que vem a ser um combate, o que dificulta a proposta de olhar para a experiência através de uma “lente” Kung Fu.

Lembro-me que quando comecei a praticar minha perspectiva era ser o “melhor lutador", na época era importante para mim a ideia de que eu seria capaz de vencer qualquer pessoa em combate, não me lembro porquê, mas naqueles tempos eu entendia que vencer seria golpear meus adversários e sair ileso.

 Esta perspectiva mudou quando eu ouvi Si Fu, Mestre Senior Júlio Camacho dizer que luta diz respeito a dois momentos: golpear e ser golpeado e para começar a desenvolver a habilidade de lutar começamos por ser golpeado. Hoje para mim isto faz todo sentido.

(Si Fu, Mestre Senior Júlio Camacho e eu, 2018)

 O que mudou meu entendimento de luta são 3 perspectivas que Si Fu não cansa de repetir:

A primeira diz respeito a obedecer, aceitar, aderir. Somente aceitando plenamente com uma escuta livre de julgamentos, neste caso, usando o braço como ferramenta para “ouvir”, e sem uma recusa inicial temos acesso a toda a proposição.


A segunda diz respeito a destrinchar o que foi aceito, analisar, quebrar em partes, questionar inteligentemente questionar, aproveitando-se efetivamente do que foi proposto; tecnicamente, este é o momento que entendemos como usar o que nos foi oferecido, neste caso o soco.


Por fim, a terceira, diretamente associada a uma nova proposição, derivada do que foi inicialmente colocado e extraindo deste todo o potencial imanente, esta etapa final de proposição pressupõe uma enorme capacidade de transmutação; neste momento a força do meu oponente que era uma ameaça é usada em meu favor.
Nem sempre cada momento está claro para mim, mas quando percebo em que etapa estou o golpe se torna consequência. O mais bacana é que como Si Fu diz, está maneira de entender a luta pode servir para entender qualquer coisa.


sábado, 11 de maio de 2019

Conexão ancestral

                             (Prato chinês)

Si Fu, Mestre Sênior Julio Camacho, certa vez estava explicando que a cozinha chinesa tem o hábito de preparar diferentes tipos de alimentos ao mesmo tempo, isto demanda uma atenção extra uma vez que cada alimento tem seu próprio tempo para cozimento, por isso, há um timming certo para adição dos ingredientes. O espaço para erro é reduzido, pois se no último ingrediente o cozinheiro errar o tempo de preparo, há risco de perder o prato inteiro.


(Celebração da cerimônia de Baai Si de Carmen Maris e Rafael Pombo)

Diversas vezes tive a oportunidade de ir a um restaurante com a família Kung Fu, nestes momentos vivi diversas experiências por conta da dinâmica de uma “mesa Kung Fu”. Servir e ser servido é uma arte de discrição e, mais uma vez, timming. Quando morei em Angola, no ano passado, tive que aprender a fazer minha comida, eu, que no Brasil mal sabia cozinhar um ovo. Nesses momentos não pude deixar de lembrar do Si Fu e suas histórias sobre culinária chinesa, o timming para cozinhar, cortar os alimentos, inseri-los na panela é preciso. Eu, com muito custo, tentei desenvolver esta arte.


(Patriarca IP Man)

No Mo Gum nós temos um espaço dedicado aos ancestrais, a materialização da nossa história através deste espaço tem uma função prática fantástica, pois desta maneira estamos de alguma forma em contato com eles e podemos usar suas histórias como exemplo. Já ouvi Si Fu contar histórias de vários de nossos ancestrais, dentre elas, acredito que uma específica do Si Jo IP Man se assemelha a minha no momento atual. Si Jo no início de sua prática jamais teve a intenção de se tornar Si Fu, sua vocação era apenas a prática da arte, o que desenvolveu com maestria. Imagino que isto se deva a proposta do Kung Fu de independente do que fizermos, devemos fazer com arte. Nunca tive pretensão de cozinhar, mas já que é este o desafio apresentado devo vive-lo e, claro, usando Si Jo IP Man como inspiração pois como a história dele conta, nunca sabemos o dia de amanhã.


sexta-feira, 3 de maio de 2019

Relação Si To


  (Si Fu e Si Mo em uma Cerimônia Tradicional.)


O eixo da Familia-Kung Fu é a relação Si-To (Si Fu/ To Dai).

Como diz o Si Fu, para que estabeleça-se uma Família-Kung Fu, basta apenas um o Si Fu precisa apenas de um To Dai.



(Si Hing Leonardo Reis e Eu, momento pós prática.)


Existe diferença entre Vida-Kung Fu e encontros casuais entre praticantes.
Ouvi Si Fu dizer, certa vez, que o fato de haver Irmãos-Kung Fu reunidos, por si só, não caracteriza Vida-Kung Fu. Isto me deixou muitíssimo intrigado pois sempre acreditei no contrário.

O que caracteriza a Vida-Kung Fu é o momento estar relacionado justamente ao andamento da Família-Kung Fu e, evidentemente, a conexão e sintonia com o Si Fu.

A segunda foto é um registro de minha prática. Neste dia tive diversas experiências significativas com o Si Hing; ele golpeou para valer, pude ressignificar medo, ansiedade e estratégia, mas o que caracterizou esta prática como um momento de Vida-Kung Fu não foi a experiência vivida, mas o fato de que cada momento estava de alguma forma relacionado ao Si Fu: aquele era eixo que conectava minha prática ao Si Hing e o Si Hing a mim.

(Si Fu, Mestre Sênior Júlio Camacho e seu To Dai, Clayton Quintino.)


 A última foto é o registro do momento em que o que acreditei por mais de 10 anos se mostrou equivocado. O bacana dessa história é que não me sinto desconfortável ou algo do tipo, me sinto intrigado em saber para onde eu estava olhando esse tempo todo que não percebi o óbvio. Este é o Kung Fu, a cada momento um aprendizado para a vida.